segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

A Nônô das Meias Altas

Para mim, a época mais tenebrosa do ano é o Carnaval! De resto, das máscaras aos foliões, das serpentinas às bombinhas de mau cheiro, dos gigantones às matrafonas, dos corsos ao samba, é tudo dantesco (já para não falar nalguns lugares como Torres Vedras, Ovar, Loulé e Sesimbra por onde é sempre aconselhável não passar) e a única memória feliz que tenho desta fantochada toda, resume-se a uma garrafita de whisky ganha num concurso de máscaras no Coconuts (uma discoteca onde a música nunca foi o ponto forte) na minha adolescência e foi um prémio que, na altura, deixou os meus pais num misto de orgulho e aflição...
O ano passado, apesar da Nônô já frequentar a escola, a educadora teve o bom senso de considerar que as crianças de 1 ano ficam desconfortáveis com máscaras, já para não falar no terror que algumas sentem ao olhar para o lado e, no lugar dos habituais coleguinhas de turma, estar o rei leão, o homem aranha ou a branca de neve. Este ano, o filme mudou e foi-nos sugerido (em modo imposição) mascarar as criancinhas e, quando perguntei à Nônô qual era a máscara que queria, foi perentória na resposta "PRINCESA", que era exactamente tudo aquilo que eu NÃO queria ouvir...não sou de cortar os sonhos de ninguém, muito menos dos mais novos, mas este teve mesmo de o ser, até porque só a palavra "PRINCESA" me irrita solenemente, já para não falar no final de algumas histórias com estas personagens que acabam pior que mal, entre tantas outras que criam nas crianças o desencantamento de verem os príncipes encantados virarem sapos, ou noutros casos, alimentam a ilusão de que a vida é sempre um conto de fadas e, mais tarde, temos mulheres adultas a esperar e a desesperar pelo seu príncipe encantado (quando muitas vezes ele está mesmo ao seu lado) e mães de filhos a sonharem ser eternamente as princesas da casa e mais uma série de barbaridades do género...
O único personagem com quem sempre tive empatia e que ainda idolatro é a Pipi da Meias Altas...não sei se é pelo seu ar reguila e traquina, pelas suas espessas tranças ruivas ou pelas inúmeras sardas na cara (que eu adoro e tanto invejo!), o que sei é que sempre gostei da irreverência desta personagem e curiosamente é a única boneca que guardei religiosamente como recordação da minha própria infância. A boneca tem mais de 40 anos e, apesar de já ter feito uma visita ao hospital das bonecas e de lá ter saído com uma vestimenta bem diferente da original, continua a ter a sua graça, embora nas mãos da Nônô, a sua integridade física não esteja seguramente garantida por mais 40 anos...
Não foi difícil persuadir a Nônô a usar esta fantasia, porque bastou o disfarce ter umas meias longas que, só por si, são a peça de roupa que a Nônô mais aprecia...adora pavonear-se com meias e collants (quanto mais coloridos e folclóricos melhor!) e a minha "batalha" matinal consiste sempre em enroupar-lhe umas calças porque obviamente só quer usar saias, vestidos e calções, para assim poder exibir as suas meias, as quais não se cansa de mostrar a todos aqueles que se cruzam no seu caminho. Depois foi só pôr à sua disposição as minhas pinturas (que também já aprecia!) e mais um adereço colorido  para o cabelo e deixa-la entrar nesta nova aventura...
E assim, por aqui, felizmente NÃO houve, Não há e NÃO haverá "PRINCESAS" (quanto muito, a rainha D. Leonor dá um ar da sua graça), mas tal como dizia a minha avozinha inspirada na história de D. Luísa de Gusmão, "antes rainha por um dia, que princesa toda a vida!"...

Ana Pádua
16/02/2015 

a Nônô das Meias Altas...



...e a Pipi das Meias Altas